EDUARDO SUPLICY E O NOSSO 8 DE ABRIL




Senado Federal

Secretaria-Geral da Mesa

Secretaria de Taquigrafia e Redação de Debates Legislativos


O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco Apoio Governo/PT - SP. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Senador Jorge Viana.
O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) – Não me convidou para assistir ao show da Joan Baez. Eu fiquei muito...
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco Apoio Governo/PT - SP) – Ficou triste?
O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) – Convidou, mas aquele convite formal, e sei que tem tanta proximidade – alguns diriam intimidade, mas eu falaria proximidade – com aquela fantástica figura, que juntou Geraldo Vandré no palco...
Com a palavra, V. Exª, meu querido colega.
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco Apoio Governo/PT - SP) – Foi uma homenagem maravilhosa a todos. As 2,5 mil pessoas, ali no Teatro Bradesco, aplaudindo de pé, quando a Joan Baez cantou a linda música Pra não dizer que não falei das flores, de Geraldo Vandré, com ele ao lado. No dia seguinte, no segundo show, novamente. Aí ele recitou um poema muito bonito também e foi extraordinariamente aplaudido. A Joan Baez o convidou para um dia gravarem um CD juntos.
Mas eu quero também expressar a minha solidariedade a todo o pessoal do Aerus, esperando juntar forças para que o propósito do Senador Paulo Paim seja alcançado, conforme o que V. Exª mencionou.
Hoje, oito de abril, comemora-se o Dia Internacional dos Povos Romani, os Ciganos.
Tenho me aproximado da questão que envolve os direitos e garantias individuais da minoria cigana em nosso País após ser alertado por Marcia Vasconcelos, da Associação Internacional Maylê Sara Kali (AMSK/Brasil).
As minorias étnicas, raciais e religiosas têm adquirido, nas últimas décadas, reconhecimento e projeção na maioria das nações democraticamente constituídas. Disso não se deve duvidar. Pelo contrário, só cabe elogiar a evolução das relações humanas. Contudo, tem-se, às vezes, a impressão de que parece haver hierarquias preconceituosas erguidas para se estabelecer níveis de diferença e distinção entre as mesmas minorias.
Desalentadoramente, esse parece ser o caso das populações ciganas em todo o mundo. Estigmatizados como povo errante, obstinadamente itinerante e sem aptidão para o trabalho fixo, correm o mundo em busca de reconhecimento étnico, respeito pela diferença e o direito pela vida em liberdade. A rigor, a inospitalidade tem prevalecido onde quer que aportem no mundo, gerando ambiente de isolamento político, econômico, social, educacional, cultural e recreativo.
Seja em Madri, seja em Roma e seja em São Paulo, o livre trânsito dos ciganos é frequentemente ameaçado pela sociedade, pelo Estado. À primeira vista, tem-se até a equivocada impressão de que eles pouco se importam com a vigilância extrema, o deboche ou mesmo a violência a que são submetidos diariamente. No entanto, a realidade não tem sido bem assim, enredando uma situação social tão dramática quanto inaceitável, a inspirar apenas o medo e a insegurança naquela coletividade.
Não me parece descabido esclarecer que a Organização das Nações Unidas, por meio da Declaração Universal dos Direitos Humanos, já propugnava garantias sociais e individuais elementares para a convivência pacífica dos povos. Embora seja inevitável admitir que avanços ocorreram desde 1948 – quando da assinatura desse documento –, ainda restam embaraços e constrangimentos na comunidade internacional quando o assunto são os direitos humanos reservados aos povos ciganos dentro de territórios nacionalmente constituídos.
De todo modo, enquanto o mal-estar permanecer, vale recordar que as origens dos povos ciganos são, ainda hoje, objeto de estudos incessantes. Contudo, a teoria mais aceita assevera que a população cigana é originária da Índia e que, há cerca de mil anos, iniciaram sua dispersão pelo mundo. Como é sabido, sua concentração demográfica mais acentuada abriga-se na Romênia, mas, na condição de sociedade historicamente nômade, seus representantes estão espalhados em quase todas as partes do Planeta.
No Brasil, segundo dados divulgados pela Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Social (SEPPIR), o primeiro registro oficial da chegada de ciganos data de 1574, ditado por um decreto do governo português ao deportar um casal para terras brasileiras. Pelos estudos, nota-se que o Brasil acolheu pelo menos três etnias ciganas: Calon, Rom e Sinti. Como se sabe, cada uma dessas etnias tem origem geográfica, línguas, culturas e costumes próprios. Enquanto os descendentes da etnia Calon são oriundos da Península Ibérica, as etnias Rom e Santi se associam aos ancestrais turcos, gregos e romanos.
De acordo com historiadores, os ciganos da etnia Sinti chegaram a nosso País principalmente após a Primeira e Segunda Guerra Mundial, escapando da Alemanha e da França. Nos levantamentos atuais do IBGE, foram identificados 291 Municípios que abrigam ainda hoje acampamentos ciganos, localizados em 21 Estados. Aqueles com maior concentração de acampamentos ciganos são, pela ordem, Minas Gerais, Bahia e Goiás. Dos 291 Municípios, 40 prefeituras declararam o desenvolvimento de políticas públicas para os povos ciganos.
Em Minas Gerais, por exemplo, a contribuição cultural dos ciganos tem atravessado décadas sobretudo na manipulação, na técnica e na arte desenvolvida com o cobre. Não por acaso, tanto turistas quanto cidadãos mineiros exaltam a forma e a beleza com que os alambiques, os tachos, os artesanatos e outros utensílios domésticos são produzidos a partir das elaboradas técnicas ciganas de exploração do cobre.
Em relação à população cigana total, estima-se que haja em torno de meio milhão de ciganos no Brasil. Vale enfatizar que a SEPPIR, por meio da Secretaria de Políticas para Comunidades Tradicionais (SECOMT), tem intensificado o diálogo com parceiros do Governo Federal para atendimento de políticas públicas específicas que garantam os direitos humanos, sociais e culturais dos povos ciganos no Brasil.
Na avaliação das autoridades da SEPPIR, houve, nos últimos dez anos, significativos avanços tanto na legislação que trata desses segmentos, como no seu acesso a programas sociais e serviços públicos. Tal resultado pode ser verificado na publicação Brasil Cigano – Guia de Políticas Públicas para Povos Ciganos, e no crescente fortalecimento político desse povo tradicional, com a presença ativa de seus representantes no debate sobre políticas públicas.
Mais que isso, ainda em 2013, foi promovido o Brasil Cigano – 1ª Semana Nacional dos Povos Ciganos, aqui em Brasília, na Granja do Torto, considerado um marco histórico na relação dos povos ciganos com o Estado brasileiro e na história dos próprios grupos ciganos no País.
De fato, pela primeira vez, reuniram-se centenas de representações ciganas de diferentes etnias e regiões, para debater políticas públicas junto com gestores públicos de diversas áreas e instituições.
Na visão de antropólogos brasileiros, em termos simbólicos, o "Brasil Cigano" se compara, de tão extraordinário, ao I Congresso Mundial Romani, realizado na Inglaterra, em 1971. Cabe ressaltar que dele resultou a fundação da União Romani Internacional, na adoção da bandeira e do hino romani como símbolos da Roma Internacional – a Nação Cigana Internacional – e no fortalecimento das ações...

(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco Apoio Governo/PT - SP) – ... de defesa dos direitos humanos dos povos romani em todo o mundo. (Fora do microfone.)
Com a realização da I Semana Nacional, definiu-se uma primeira pauta objetiva de reivindicações e propostas, que merece ser igualmente aqui destacada. Entre as mais expressivas, vale mencionar a construção de estratégias para garantir a participação em instâncias de controle social, como os conselhos municipais, estaduais e nacionais. Além da garantia que o MEC inclua conteúdo adequado sobre a cultura cigana nos materiais didáticos, solicita-se o estabelecimento de escolas específicas para as crianças da etnia. Reivindica-se a garantia da geração de emprego e renda, ao lado de campanhas sistemáticas de combate ao preconceito aos ciganos.
Para concluir, gostaria de enfatizar o compromisso de estender a todas as minorias culturais, étnicas, raciais, sexuais e regionais no Brasil os direitos inalienáveis da convivência igualitária com o resto da população nacional. Avalio que devemos empenhar nossa irrestrita solidariedade à causa dos ciganos no Brasil e no mundo, como, de fato, vem sendo realizado pela Ministra Luiza Bairros, da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial.
Temos um desafio social pela frente. A partir dessa experiência, que esperamos ser bem-sucedida, quem sabe não exportaremos nosso know-how para outros países ainda tão obstinadamente intransigentes com os povos ciganos?
Muito obrigado, Senador Presidente Jorge Viana.

E segue a Caravana, a Kumpanhia, rumo ao reconhecimento,
ainda falta muito,
mas não vamos desanimar.
Começamos a existir.

AMSK/Brasil